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Liberdade religiosa dos imigrantes no Brasil

Liberdade religiosa dos imigrantes no Brasil

a cura di Rogeria Pires Pinto de Azevedo

Palavras chave: Imigração, liberdade religiosa, direito de culto, intolerância religiosa, Missão Paz.

 

  1. A laicidade e a liberdade religiosa das constituições brasileiras.

A Constituição do Império no Brasil, outorgada em nome da “Santíssima Trindade“, estabeleceu a religião católica romana como a fé oficial do império. Contudo, Celso Ribeiro Bastos [1] observa que, apesar da liberdade de crença, a liberdade de culto era restrita. Segundo sua análise, apenas o culto católico era reconhecido como livre, enquanto outras religiões eram permitidas a praticar apenas cultos domésticos, sendo proibidas de manifestar suas crenças por meio de templos ou outras formas exteriores de adoração. Essa limitação reflete a forte influência da Igreja Católica naquela época e as relações entre o Estado e a religião no contexto do Brasil Império. Mudanças significativas nesse panorama ocorreram mais tarde, especialmente com a transição para a República, buscando uma separação mais clara entre os domínios religioso e estatal.

Após a proclamação da República, que se deu em 15 de novembro de 1889, Ruy Barbosa[2] redigiu o Decreto 119-A, de 7 de janeiro de 1890, separando definitivamente o Estado e a Igreja Católica Romana no Brasil

Em seu artigo 1º, referido Decreto determinava que “é proibido a autoridade federal, assim como a dos Estados federados, expedir leis, regulamentos ou atos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e criar diferenças entre os habitantes do país, ou nos serviços sustentados à custa do orçamento, por motivos de crenças, ou opiniões filosóficas, ou religiosas”[3]

O artigo 2º preconizava a ampla liberdade de culto, enquanto os artigos 3º e 5º previam a liberdade de organização religiosa sem a intervenção do poder público[4]

Conforme leciona Aldir Guedes Soriano,[5] “a constitucionalização do novo regime republicano consolidou, através da Constituição de 1891, a separação entre a Igreja e o Estado, fazendo do Brasil um estado laico

Segundo Fábio Dantas de Oliveira,[6] “a Constituição Federal de 1891 representou um marco no que tange à laicidade do Estado, pois todas as Constituições que lhe sucederam mantiveram a neutralidade inerente a um Estado Laico, ainda que teoricamente”.

A liberdade religiosa na Constituição Federal de 1988 ampliou essa liberdade e até fornece-lhe uma garantia específica. Diz, no art. 5º, VI, que é assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, proteção aos locais de culto e a suas liturgias. (…)

O trecho transcrito refere-se a um dispositivo que consiste em duas partes distintas: a primeira assegura a liberdade irrestrita para o exercício dos cultos religiosos, enquanto a segunda oferece proteção aos locais de culto e suas práticas litúrgicas, mas dentro dos limites estabelecidos pela lei. É importante ressaltar que, embora a lei possa regulamentar aspectos específicos relacionados aos locais de culto e suas liturgias, a definição fundamental desses locais e práticas está intrinsecamente ligada à liberdade incondicional de exercício dos cultos religiosos. O texto destaca que essa liberdade não deve ser sujeita a condicionamentos externos. Cabe ressaltar que certos espaços públicos, como praças, não são considerados propriamente locais de culto, mas a garantia da liberdade de exercício religioso permanece intacta.

Para Iso Chaitz Scherkerkewitz,[7] “a liberdade de religião não está restrita à proteção aos cultos e tradições e crenças das religiões tradicionais (Católica, Judaica e Muçulmana), não havendo sequer diferença ontológica (para efeitos constitucionais) entre religiões e seitas religiosas”.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi promulgada “sob a proteção de Deus”, como é possível verificar em seu preâmbulo.

  1. Liberdade religiosa

Como um país de proporções continentais, o Brasil tem testemunhado, ao longo de sua história, a chegada de numerosos grupos de estrangeiros. Essa diversidade resulta tanto de migrações motivadas por desafios econômicos e financeiros, associados ou não a conflitos mundiais ou locais, quanto das dolorosas marcas deixadas pelo período escravagista. O Brasil, sendo um verdadeiro caldeirão de culturas, línguas e tradições, naturalmente se torna um território onde coexistem uma ampla variedade de religiões e crenças, refletindo a rica tapeçaria cultural formada pela diversidade de povos que compõem nossa população.

Estatui o artigo 5º. da Constituição Federal que:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinções de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Brasil a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

VII – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e às suas liturgias

VII — é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; ”[8]

A garantia de proteção ao direito fundamental à liberdade de consciência e crença, que é assegurado como inviolável, destaca a sua importância no âmbito da Constituição. Isso reflete a significativa atenção dada pelo legislador constituinte brasileiro a esse direito fundamental.

Pode-se afirmar, em consonância com os princípios da nossa Constituição, que é legítima a orientação de Soriano [9] de que o Estado tem a responsabilidade de preservar a diversidade religiosa em seu território. Para tanto, deve criar as condições necessárias para que as práticas religiosas das diferentes crenças ocorram de maneira fluida e sem obstáculos, zelando pela pureza do princípio de igualdade religiosa. Contudo, é imperativo que o Estado mantenha uma postura imparcial em relação aos eventos religiosos, evitando assim incorporá-los em sua ideologia institucional.

A liberdade religiosa foi expressamente assegurada uma vez que esta liberdade faz parte do rol dos direitos fundamentais, sendo considerada por alguns juristas como uma liberdade primária.[10]

Segundo Soriano,[11] a liberdade religiosa é o princípio jurídico primordial que orienta as relações entre o Estado e a Igreja, em sintonia com o direito fundamental dos indivíduos e grupos de sustentarem, defenderem e difundirem suas convicções religiosas. Os demais princípios, direitos e liberdades relacionados à matéria religiosa são considerados como coadjuvantes e solidários ao princípio essencial da liberdade religiosa.

A liberdade religiosa transcende a mera preservação de ritos, tradições e crenças vinculadas a religiões convencionais, como a Católica, Judaica e Muçulmana. Não há, para fins constitucionais, uma distinção ontológica entre religiões estabelecidas e seitas. O critério para determinar se o Estado deve proteger os rituais, costumes e tradições de uma organização religiosa não deve depender do nome da religião, mas sim de seus objetivos. Se a organização busca o aprimoramento individual, contribuindo para o bem da sociedade e praticando a filantropia, ela merece a proteção do Estado.

Deve-se ampliar ainda mais o conceito de liberdade religiosa para abranger também o direito de proteção aos não-crentes, ou seja, àqueles que possuem uma posição ética, não necessariamente religiosa, visto que não adotam um credo específico. Em certo sentido, esse alargamento vai além do âmbito da fé, uma vez que a liberdade preconizada engloba tanto a liberdade de fé quanto a liberdade de crença. Portanto, é apropriado enquadrar essa liberdade dentro do contexto da liberdade religiosa, e não simplesmente como parte da liberdade de pensamento.[12]

Pontes de Miranda[13] reforça esses argumentos ao ponderar sobre a inclusão da liberdade de pensar contrariamente a uma religião específica ou a todas as religiões no contexto da liberdade de pensamento. Ele destaca que, inicialmente, o princípio não englobava essa expressão de pensamento, sendo posteriormente incorporado e sua nomenclatura modificada para ‘liberdade de crença’, a fim de abranger tanto teístas quanto ateus. Conclui, por fim, que “liberdade de religião é liberdade de se ter a religião que se entende, em qualidade, ou em quantidade, inclusive de não se ter.”

  1. Intolerância religiosa.

Apesar dos esforços das autoridades, da sociedade por meio de ONGs e iniciativas culturais para combater a intolerância religiosa no Brasil, os casos têm aumentado de maneira expressiva. O Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, em 21 de janeiro, foi instituído pela Lei Federal nº 11.635/2007, sendo parte do calendário cívico da União. É crucial destacar sua importância, especialmente diante do alarmante aumento de 45% nos ataques em 2022, comparado a 2020, totalizando 1.200 incidentes.

O secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, Bruno Renato Teixeira, enfatiza a compreensão crescente de que a violência e agressões motivadas pela religiosidade representam uma clara violação dos direitos humanos. Para combater a intolerância religiosa e garantir a laicidade brasileira, o governo estabeleceu a Coordenação de Promoção à Liberdade Religiosa.[14]

O Código Penal Brasileiro, em seu artigo 208, configura como crime o escárnio público motivado por crença ou função religiosa, assim como a perturbação de cerimônias religiosas ou o vilipêndio público a atos ou objetos de culto religioso. A pena para esses atos varia de detenção de um mês a um ano ou multa, sendo aumentada em caso de violência. Recentemente, a Lei nº 14.532/2023 complementou o artigo 140 do Código Penal, estipulando que, no crime de injúria envolvendo elementos religiosos, a pena será de reclusão de um a três anos, além de multa. [15]

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a analisar se pessoas que usam trajes religiosos têm o direito de aparecer em fotografias de documentos oficiais com essas vestimentas. O Ministro Luís Roberto Barroso, representando o Poder Judiciário, condenou a intolerância religiosa, destacando que todos os grupos religiosos merecem respeito. Ele enfatizou que a islamofobia e generalizações injustas não têm justificativa. Essas ações indicam um esforço para promover a tolerância e garantir a diversidade religiosa no Brasil. Barroso também repudiou a onda de antissemitismo que se espalhou pelo mundo e que teve manifestações no Brasil após a reação de Israel ao ataque do Hamas. O episódio, disse, “revive no povo judeu os horrores de tempos passados”. [16]. O julgamento será retomado em data ainda a ser definida com os votos dos ministros.

  1. Missão Paz

Cada ser humano busca conforto e proteção, sendo que alguns estudiosos sugerem que as origens das crenças religiosas surgem do desejo de segurança diante do “temor cósmico“. Para aqueles que enfrentam o desenraizamento social e cultural, como é o caso dos migrantes, a vulnerabilidade é ainda maior. Eles se veem obrigados a redefinir sua identidade, perspectiva de mundo e escolhas fundamentais, gerando uma sensação mais intensa de desamparo e insegurança. Nesse cenário, a religiosidade pode se tornar um recurso crucial. A proteção oferecida pelo sagrado também se manifesta no apoio e refúgio proporcionados pelas comunidades religiosas no novo local. Muitas vezes, migrantes com convicções religiosas buscam participar de locais de culto, celebrações e outras atividades promovidas por sua denominação religiosa, integrando-se a uma comunidade que frequentemente desempenha um papel significativo de apoio. Assim, a proteção divina não é apenas buscada na consulta da vontade divina, mas também se concretiza por meio do suporte oferecido pela comunidade de fiéis.

Durante os anos de 2011 a 2020, destaca-se a predominância dos fluxos migratórios provenientes de países como Venezuela, Haiti, Bolívia e Colômbia. A maioria dos migrantes provenientes dessas nações, notadamente os venezuelanos, bolivianos e colombianos, segue a fé católica, encontrando no Brasil diversos locais de culto para praticar sua religião. No caso dos haitianos, embora declarem ser católicos, muitos deles também praticam os rituais do Vodu, uma religião de origem africana que, desde 2003, é considerada a religião oficial do Haiti. Essa diversidade religiosa entre os migrantes reflete as diferentes influências culturais e a maneira como as práticas religiosas se entrelaçam com as identidades dos grupos migrantes. [17]

A Missão Paz tem suas origens em 1939 com o objetivo de apoiar a comunidade migrante de italianos, ao longo das décadas seguintes, expandiram sua missão para migrantes de diferentes nacionalidades e refugiados. Com o objetivo de fomentar uma variedade de atividades relacionadas à temática migratória, envolvendo tanto pesquisadores quanto membros da comunidade interessada, através da realização de palestras, grupos de estudos e do fornecimento de assessoria a pessoas e organizações da sociedade civil engajadas com a mobilidade humana, almeja oferecer soluções para os desafios e questionamentos enfrentados nos serviços de acolhimento. Assegurando a formulação de políticas públicas eficientes e garantindo direitos para a população migrante e refugiada no Brasil. [18]

Paralelamente, colaboram com a produção acadêmica por meio de estudos e análises de caso sobre o fenômeno migratório e as condições dos imigrantes em deslocamento ao redor do mundo. Essa abordagem visa contribuir não apenas para a compreensão aprofundada do tema, mas também para promover impactos positivos e orientar ações que beneficiem a comunidade migrante de maneira mais abrangente.

A Casa do Migrante, vinculada à Missão Paz, serve como abrigo para apátridas, imigrantes, solicitantes de refúgio e refugiados, adaptando-se às suas necessidades individuais. Com capacidade para acomodar até 110 pessoas, o espaço possui dormitórios segregados por gênero, áreas de convivência mistas, como sala de TV, biblioteca, sala de reuniões, brinquedoteca e lavanderia. A estadia na Casa do Migrante abrange alimentação, aulas de português, suporte psicológico e acompanhamento de assistentes sociais. Todos os residentes recebem materiais de higiene pessoal, roupas e têm a possibilidade de utilizar o endereço para recebimento de correspondência. [19]

Durante o ano, a casa promove atividades que incentivam a convivência, o intercâmbio cultural e a adaptação dos migrantes, solicitantes de refúgio e refugiados à nova vida. Isso inclui palestras formativas, encaminhamento para cursos profissionalizantes, atividades de lazer e celebrações festivas.

Que católicos, judeus, umbandistas, cristãos, budistas, muçulmanos, cabalistas, hinduístas, espiritualistas, protestantes, taoístas e seguidores de outras religiões, assim como agnósticos e ateus de diferentes nacionalidades, possam coexistir cada vez mais em harmonia e respeito. A busca por Deus une aqueles que compartilham uma esfera ampla de ecumenismo e harmonia. Da mesma forma, aqueles que não professam crenças religiosas fazem parte da humanidade livre, merecendo respeito tanto quanto aqueles que têm crenças. [20]

 

[1] Bastos, R.Celso “Curso de Direito Constitucional. ” 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999. P. 98.

 

[2] Barbosa, R.  Constituição Federal”, 1889. Disponível em:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/D119-A.htm

 

[3] Barbosa, R.  Constituição Federal”, 1889. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/D119-A.htm

 

 [4] Barbosa, R “Constituição Federal”, 1889.Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/D119-A.htm

 

  [5] Soriano, G. Aldir. “Liberdade Religiosa no Direito Constitucional e Internacional”. São Paulo. Editora: Juarez de Oliveira, 2002, p. 85.

 

 [6] Oliveira, D. Fabio, “Aspectos da liberdade religiosa no ordenamento jurídico brasileiro”. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2966, 15 ago. 2011. Disponível em:  http://jus.com.br/revista/texto/19770

[7] Scherkerkewitz, Iso Chaitz. “O Direito de Religião no Brasil”. Revista da PGE. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm>

 

[8] “Constituição da Republica Federativa do Brasil. ” 1988. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016.pdf

 [9] Soriano,R. ob. cit., p. 64. 2004. Disponível em: https://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm

 

 [10] Soriano, R. ob. cit., p. 62. 2004. Disponível em: https://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm

 

 [11] Soriano, R. ob. cit., p. 61. 2004. Disponível em: https://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm

 

[12] Soriano, R. ob. cit., p. 76. 2004. Disponível em: https://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm

 

[13] Pontes de Miranda, F. C. “Comentários à Constituição de 1967com a Emenda

  1. 1, de 1969. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974. v. 5, p. 123.

 

[14] Disponível em: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2024/01/21/brasil-tem-aumento-de-denuncias-de-intolerancia-religiosa-veja-avancos-e-desafios-no-combate-ao-crime.ghtml

 

 [15]  Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14532.htm

 

 [16] Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=526642&ori=1 RE 859376 com repercussão geral (Tema 953).

 

 [17] Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-12/numero-de-novos-imigrantes-cresce-244-no-brasil-em-dez-anos

 [18] Disponível em://missaonspaz.org/historico-da-missao-paz

 [19] Disponível em: https://missaonspaz.org/historico-da-missao-paz

 [20] Disponível em: http://conjur.com.br

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